Filme: Estômago
“Estômago” é um filme de 2007 dirigido por Marcos Jorge, eleito pelo jornal O Globo como um dos 10 melhores filmes brasileiros da década. O próprio nome já sugere a carnalidade que iremos encontrar no longa-metragem. Prepare o estômago! Aqui o prazer é colocado ao lado das necessidades humanas de sobrevivência física ou social, a comida não possui apenas a função de alimentar, mas está diretamente associada ao poder. O filme nos mostra que quem domina as técnicas culinárias acaba por ascender socialmente. E é justamente isso que acontece com o nosso protagonista, Raimundo Nonato (João Miguel), ao longo do filme. Nos é mostrado que o prestígio e o desprestígio social estão diretamente relacionados ao sexo e/ou à comida como elementos de manipulação do poder. A prostituta, por quem Nonato se apaixona, se vende por um bom prato de comida e acaba “comida”. Há sempre um contraste entre as necessidades fisiológicas e ao prazer a qualquer custo, seja este proporcionado pela alimentação como pelo sexo ou, até mesmo, como acontece em algumas cenas, o prazer proporcionado por ambos ao mesmo tempo.
Pois bem, o filme começa com o protagonista na cadeia contando o que aprendeu sobre o milenar, mas fedido, gorgonzola. O restante do filme se desenvolve a partir de dois eixos temporais, o tempo do agora (a cadeia), e o tempo passado (sua trajetória até chegar na cadeia). Nonato, nosso anti-herói, é um personagem complexo, migrante nordestino recém-chegado à maior cidade do Brasil. É inicialmente apresentado com suas características de ingenuidade e humildade. Sem dinheiro e com fome, acaba hospedado em um quartinho num boteco. Ele desenvolve suas habilidades culinárias e começa a mudar seu destino, que antes parecia ser fadado à mediocridade. Nonato eleva o nível e o respeito de si e do boteco que trabalha, fazendo uma coxinha que nos faz querer entrar na tela. Com todo esse potencial culinário, ele é convidado para trabalhar na “cozinha internacional com ambiente familiar”, o restaurante italiano Boccacio, onde toma lições com o dono que ensina Nonato, de forma mais profissional, sobre o universo da Gastronomia, apresentando ingredientes, técnicas e cultura alimentar. A ética, meio desajustada, do protagonista o leva para a cadeia, mas não imaginamos como ele vai parar lá. Um desfecho épico para um anti-herói, onde o deleite é o maior crime!
Quando escolhi “Estômago” para estrear minha participação nessa nova coluna ao lado da Mari Mori, pensei em fazer a coxinha de frango de tanto sucesso no filme, o pastel de carne que protagoniza toda uma cena inicial, o macarrão à putanesca que a amada de Nonato ouviu dizer que era chique, a farofa de formigas que causou discórdia na prisão, o queijo gorgonzola com a goiabada que o dono do Bocaccio preparava, o carpaccio que é confundido com carrapato, o porco e o peixe assados no banquete da prisão, ou várias outras receitas que aparecem nesse filme que tanto me desperta sensações diversas. Mas resolvi fazer algo que celebrasse, principalmente, a brasilidade do longa-metragem e a simplicidade malandra do protagonista. Escolhi, então, a tradicional receita de carne de panela com batatas coradinhas. O prato que enlouqueceu o dono do restaurante italiano e fez com que Nonato saísse do velho boteco e fosse à cozinha profissional do Boccaccio.
INGREDIENTES
Carne de panela
- 600 gramas de músculo em cubos médios
- 350 ml de cerveja escura
- 4 tomates médios sem pele em meia lua
- 2 cebolas grandes em meia lua
- 1 cenoura média ralada
- azeite de oliva para refogar
- sal a gosto
- pimenta do reino (moída na hora) a gosto
- salsinha fresca picada para finalizar
Batatas coradinhas
- mini batatinhas
- óleo de girassol
- sal a gosto
MODO DE PREPARO DA CARNE DE PANELA
- Tempere a carne com sal e pimenta do reino, moída na hora, a gosto e deixe descansar por 5 minutos
- Deixe esquentar bastante uma panela, coloque um pouco de azeite de oliva e sele os cubos aos poucos
- Depois de selados, acrescente a cebola em meia lua e a cenoura ralada e refogue até que murchem
- Em seguida acrescente o tomate sem pele em meia lua para que solte líquido e comece a desgrudar os tostadinhos da panela
- Despeje a cerveja e tampe
- Deixe cozinhar em fogo médio por uma hora e meia à duas horas, ou até que a carne fique bem macia
- Quando necessário acrescente água para que o caldo não seque por completo
MODO DE PREPARO DAS BATATINHAS
- Em uma panela coloque água com sal para ferver
- Quando a água estiver fervendo acrescente as batatinhas
- Ao conseguir colocar uma faca e a batatinha sair com facilidade (cozida, mas não muito mole), retire-as da água
- Retire a casca das batatinhas e as salgue
- Em uma frigideira coloque óleo e sele o entorno de cada uma
DICAS
Cozinhe sempre as batatinhas com a casca, para que concentre todo o seu sabor e não o perca na água do cozimento. É fundamental selar a carne antes de refogar os outros ingredientes, para que conserve o sabor e os líquidos no seu interior. Deve-se selar poucos cubos de cada vez para que não diminua a temperatura da panela.
É importante também que o tomate esteja sem pele, já que no final de todo o processo de cocção teremos um caldo grosso por meio dos sólidos (tomate, cebola e cenoura) que irão se desfazer. Não se esqueça de acrescentar água aos poucos para que o caldo não seque. Salgue a carne no começo, pois se tentar corrigir o sal da carne depois que ela estiver no caldo, o sal pegará apenas no caldo e a carne continuará sem sal. Depois de salgado a carne só deixe para salgar o caldo no final, já que irá reduzir bastante, concentrado o sabor e os temperos. Se quiser um toque um pouco mais condimentado, coloque um pouquinho de tempero baiano em pó.