Paladar pessoal x cultural
Nossa pré-disposição a gostar ou não gostar de alguns sabores é ativada na infância. Qualquer pessoa é absolutamente apta a gostar de qualquer sabor, desde que seja exposta a esse desde sua infância, sendo assim, as preferências de sabores são um fator socialmente construído e de cunho cultural. Entre as possibilidades que somos expostos, fazemos escolhas pessoais, às vezes por necessidades fisiológicas, outras por lembranças afetivas. Mas o que condiciona certa sociedade a gostar mais de um sabor do que de outros? Normalmente fatores ambientais, o alimento que é propício a certos climas, solos e regiões, construindo – assim – uma cultura histórica de tradição alimentar baseada nas condições ambientais.
Com o advento das grandes navegações houve uma circulação de diferentes ingredientes antes não conhecidos pelos outros continentes. Houve, assim, uma troca não só de sabores, mas também de conhecimento (claramente que essa relação aconteceu em uma perspectiva entre metrópole-colônia). A partir de então, aos poucos, especiarias da Ásia se fundem com o conhecimento gastronômico da Europa e com ingredientes da América. Séculos depois, com a globalização, meios de comunicação e de circulação de mercadorias se desenvolveram de tal forma que, hoje, não dispomos mais apenas dos alimentos produzidos em nossas regiões locais, e com isso, temos acesso a cada vez mais sabores (mas quais são os sabores que interessam ser importados?).
foto: Guia Hoje
Com toda essa movimentação observamos uma faca de dois gumes: por um lado é absolutamente positivo que os sabores de diversas culturas se difundam pelo mundo; por outro, sabemos que não é exatamente de forma igualitária que isso ocorre. A acessibilidade por vezes é ilusória, pois há uma imposição de superioridade que tenta nos convencer de que “há sabores melhores do que outros”. Primeiro nossa referência europeia, enquanto antiga metrópole, posteriormente o imperialismo estadunidense que foi determinante na imposição de nossos hábitos alimentares. É incrível como somos cíclicos. Hoje, com correntes contemporâneas, tentamos revisitar nossa cultura local e valorizar os nossos produtos regionais.
Ainda temos muito que caminhar na direção de prestigiar novos sabores, aprendendo a valorizar novas experiências no que diz respeito ao paladar. Lembre-se que, a uma criança, o azedo e o amargo pode não ter uma valoração negativa, desde que seja colocada desde a infância por seus pais. Da mesma forma que, para uma criança, um vinho e um queijo não lhe parece tão interessante quando um purê de maçã ou pêra. O nosso paladar é construído, aos poucos, desde a infância e nossa predileção é condicionada pela predileção de nosso meio. Desconfiar do que gostamos é um primeiro passo para repensarmos sobre os sabores que rejeitamos.