Com açúcar, com afeto
Como já dizia Chico Buarque, açúcar é afeto. Ponto. Com açúcar podemos espalhar doçura pelo mundo através dos doces mais delicados e irresistíveis. Mas como todo doceiro sabe, ou deveria saber, um açúcar só não faz verão, ou melhor dizendo, doces! Atualmente a utilização dos açúcares na confeitaria tem quase o mesmo papel que o sal na cozinha – é um ingrediente que intensifica as notas de suas sobremesas ao invés de se realçar mediante os outros ingredientes, ou seja, confere palatabilidade.
Foi-se o tempo em que a frase “brasileiro gosta é de coisa doce, enjoativa” era correta. Na verdade, não sei se algum dia essa frase chegou a ser verdadeira. O fato é que brasileiro gosta sim de doce, mas como tudo na vida deve ter seu equilíbrio, o doce meus amigos, também deve ser assim! E para isso é preciso compreender que o açúcar refinado, aquele bem branquinho, não é o único açúcar a estar presente na sua cozinha.
Dependendo do grau de intensidade de doçura, da coloração e textura que você deseja, utilizar a gama de açúcar que temos hoje ao nosso serviço, é fundamental para acertar a mão de açúcar. Cada açúcar possui um sabor, cor, nível de doçura e composição nutricional distintas. Quanto mais escurinho mais nutrientes o açúcar terá, mais vitaminas, mais sais minerais, mais tudo – isso porque ele simplesmente está mais perto do seu extrato bruto [pense no açúcar mascavo!]. Quando muito branquinho, como o açúcar refinado, isso significa que ele passou por um processamento químico, sendo aditivado com enxofre por exemplo, o que o deixa branco, gostoso e sem nutriente algum – bom, para não falar nenhum, encontramos em média de 1 a 2mg de nutrientes, mas mesmo assim, são insignificantes gerando a tal da caloria vazia, que fornece apenas energia!
Além de tudo isso o açúcar oferece conservação por conta de seu efeito sobre a atividade de água no alimento, ou seja, torna a água inacessível aos microrganismos. Gera sabores e cores através de sua interação com proteínas, quando aquecidas – a famosa reação de Maillard, além de sozinho, possuir o poder de caramelização e pode conferir um enriquecimento nutricional na alimentação, dependendo claro, do açúcar utilizado.
Tipos de açúcares
- Glicose: também conhecida como dextrose [sim, aquela que o pessoal do fitness gosta de usar] é encontrada em frutas, legumes, no mel, no açúcar invertido e no xarope de milho. Usamos por exemplo para produção de sorvetes, pois o seu maior poder é evitar a cristalização e formação de cristais muito grandes.
- Frutose: é um açúcar extraído de frutas e legumes, como o milho e no Brasil encontramos a um preço elevadíssimo!
- Maltose: encontrado no malte
- Lactose: encontrado no leite
- Sucrose: produzida comercialmente a partir da cana de açúcar e do açúcar de beterraba.
Desses tipos de açúcar, produzimos os seguintes produtos:
De confeiteiro – Ao contrário do que muita gente pensa, o açúcar de confeiteiro não é o açúcar impalpável! Não? Oi? NÃO! O açúcar de confeiteiro é o açúcar refinado em uma textura parecida com o talco, bem fininho, que após passar por uma peneiragem, resulta em minicristais. Por conta desses cristais tão pequenos ele é um açúcar que empedra muito fácil. Portanto, para utilizá-lo, é importante sempre – eu disse SEMPRE – peneirar, senão é bem capaz de você encontrar várias pedrinhas de açúcar bem duras na sua produção. Aqui no Brasil é mais conhecido como Glaçúcar, já que a União, aparentemente é a única produtora. [se você conhecer outras marcas, deixe nos comentários!]
Esse açúcar é ótimo para fazer glacê e para usar em preparações que você precise de um textura mais delicada.
Impalpável – O açúcar impalpável é uma mistura de açúcar de confeiteiro com amido – que pode ser de milho, arroz, etc. Ele é menos adocicado que o açúcar de confeiteiro – justamente por esse concentração de amido – e “empedra” menos [também por conta do amido de milho] que evita que um grãozinho de açúcar grude no outro. Ele é usado para dar aquela chuvinha de açúcar bonita que vemos em cima de bolos e tortas. Eu considero um blush para os docinhos! Além disso ele também é o açúcar ideal para o preparo da pasta americana e o meu preferido quando eu busco uma textura suave e não tão doce quanto o açúcar de confeiteiro. A confusão entre esse açúcar e o açúcar de confeiteiro é que os americanos dão o mesmo nome para ambos os açúcares, e aqui no Brasil diferenciamos através da presença ou não de amido. Para esse açúcar também podemos encontrar nomes como açúcar gelado – entretanto o açúcar gelado, feito a partir da dextrose, contém outros ingredientes que dão essa característica “geladinha” do açúcar.
Açúcar refinado – Como já falamos, o açúcar refinado é um açúcar pobre em nutrientes que passou por uma etapa de refino com aditivação de enxofre para deixá-lo lindamente branquinho, formando com isso caloria vazias.
Açúcar cristal – É um açúcar, como o próprio nome já diz, é um açúcar com cristais grandes, que são mais difíceis de serem dissolvidos. O que o difere do açúcar refinado é que o refinamento para formação do açúcar cristal retirar “só 90 dos seus sais minerais, restanto alguns 10% para contar história!
Açúcar demerara – Pode ser encontrado tanto no formato de finos cristais como de cristais maiores e sua diferença, bem significativa. É que ele passa por um refinamento leve sem aditivação, permitindo que ele mantenha uma coloração marrom clara e contenha valores nutricionais semelhantes ao açúcar mascavo, que é o açúcar mais bruto que encontramos com facilidade.
Açúcar mascavo – O açúcar mascavo, ao contrário do que muita gente pensa, é um açúcar refinado também. Claro que ele não recebe o mesmo tratamento do açúcar branco, ou refinado, mas em comparação a esse açúcar, o mascavo tem 90% de “pureza” contra quase 100% do açúcar refinado. É um açúcar com mais nutrientes, já que os mesmos foram mantidos e só são retirados no processo de lavagem e descoloração. Mas não pense que o açúcar mascavo é extremamente rico em nutrientes e sais minerais. Sua ingestão não representa em grandes ganhos nutricionais, mas quando comparado ao açúcar refinado, esse é sim a melhor opção.
O tal do açúcar invertido – Esse açúcar mistura até três poderosos adoçantes, como a glicose, a frutose e a sacarose, que falamos lá no início. O principal poder desse açúcar é evitar a cristalização dos alimentos. Sei que em muitas cidades é quase que impossível encontrar o açúcar invertido; para isso basta substituir pelo mel, que é um açúcar invertido natural – só cuidado com o sabor, que poderá alterar um pouquinho sua preparação. Como o próprio nome diz, o açúcar invertido possui uma molécula invertida – ou seja, na estrutura da molécula da glicose, através da hidrólise, invertemos um radical e padabam – criamos o açúcar invertido!
Frutose – É o açúcar mais doce que podemos encontrar – cerca de 30 vezes mais poder adoçante que o açúcar refinado. Esse açúcar, extraído de frutas e principalmente do milho, não precisa de nenhum aditivo para ser produzido mas, da mesma maneira que o açúcar refinado, não contém vitaminas.
Por fim o açúcar orgânico, que tem dado o que falar! – É um açúcar com o mesmo poder adoçante do refinado, mas sua diferença é que ele não leva nenhum aditivo químico durante seu processamento. Todo o processo, mais natural possível, faz com que ele tenha uma cor mais dourada, com grãos maiores e claro, precinho lá em cima!
Para finalizar nosso primeiro contato com os açúcares, é importante ter na cabeça a escala de doçura deles, assim fica fácil quando for necessário substituí-los para produzir doces mais leves e balanceados! Partindo de um número 100, onde se encontra a sacarose, nosso açúcar refinado, a frutose teria como um poder de 173 [muito doce] – a Glucose, ou dextrose, glicose, é 74, ou seja, mais suave ao nosso paladar. A Lactose, o açúcar do leite, bem fraquinho, possui um poder de doçura 16, e por fim a maltose, proveniente do malte, que está logo abaixo da glucose, com um poder de doçura 60.