Auberge des Trois J
Durante a primeira vez que vim visitar Paris eu tive a oportunidade também de conhecer um pedacinho do interior, mais precisamente a região da baixa Normandia. Lógico que não conheci tudo, mas achei impressionante a quantidade de pequenos vilarejos muito bem cuidados, com casinhas e castelos do século XVI e XVII que eu encontrei pelo caminho. Os lugares são tão lindos que parecem mais cidades cenográficas. Ainda não me entrou na cabeça como podem existir locais tão lindos onde as pessoas realmente vivem. Vilarejos de no máximo 200 habitantes e que mesmo assim possuem um centro comercial, com ótimas pâtisseries, boulangeries e boucheries disponíveis. Não interessa o quanto isolado seja o lugar, francês que é francês precisa comer bem sempre!
Além das pâtisseries, boulangeries, boucheries e pequenos castelos medievais, esses vilarejos guardam ainda outros tesouros. Tesouros aliás muito bem escondidos de turistas, que não constam em guias moderninhos ainda. São aqueles locais que você precisa conhecer alguém, que conhece alguém que conheça o lugar. E foi assim que eu conheci o Auberge des Trois J.
Este restaurante fica justamente em uma dessas pequenas vilas de casas medievais, chamada Nocé, na baixa Normandia, e que mesmo não tendo nem um semáforo, ela tem um restaurante com um cozinha e chef dignos de grandes metrópoles! E pode procurar o restaurante no Google que você não vai encontrar muita informação, além de alguns poucos comentários no Trip Advisor e outros sites que mencionam o nome, endereço e telefone do local. Bom, ao menos você conseguirá fazer uma reserva, que é primordial! Foi o meu namorado que insistiu em me levar e ele, num nível de chatísse e exigência absurda para com restaurantes (coisa de gente da área), teceu muitos elogios sobre o lugar. Contou inclusive que parece que o chef do local “recusou” as estrelas do guia Michelin que ofereceram a ele. Ele era muito “cool” para ter o seu restaurante em um guia assim… tão comercial. Tem como não amar esses franceses?
Ao chegar no restaurante, que faz parte de um pequeno hotel da região, você será recebido por uma hostess bastante gentil que te conduzirá à sua mesa, sem demoras. O local tem uma atmosfera tranquila, com aquela luz indireta e meio baixa, onde as pessoas quase sussuram para falar umas com as outras. A decoração é minimalista e elegante, e de fato, não acho que precisava de mais nada.
São várias as opções de pratos no cardápio mas, como ter opções variadas é algo que me gera um certo pânico, me enchi de coragem e pedi o menu degustação. Ultimamente eu tenho tinho uma preguiça absurda de escolher pratos em restaurantes, pois sempre quero mais de um prato e é claro que não aguento comer mais de um. Sem contar que por vezes não gosto do que escolhi e fica aquele “Ah! Deveria ter pego o outro…”. O chef pergunta se existe algo que você não goste de comer, se tem alguma alergia, e ele te apresentará um menu surpresa! Foi um amuse bouche, uma entrada, dois “pratos principais”, um prato de queijos, sobremesas e mais umas “firulinhas”, como dizem meus amigos aí, para acompanhar o café. De bebida, entrei no clima e pedimos para que o chef harmonizasse os pratos com vinhos em taça de sua escolha.
O amuse bouche aqui é o nosso “couvert” e cada um recebeu um pratinho com uma salada microscópica, um camarão empanado e uma manteiga de ervas em uma colherinha de chá, não se esquecendo dos pães caseiros para acompanhar. Ah sim, me fizeram o grande favor de pedir um vinho do Porto branco como aperitivo.A entrada foi a mais francesa o possível: um delicioso foie gras com trufas negras e farofinha de castanha de cajú, harmonizado com um ótimo Jurançon. Para quem ainda não teve o prazer de provar, foie gras é tradicionalmente servido com algum vinho de sobremesa, geralmente um Sauternes, mas este Jurançon estava excelente (mas para o pavor do namorado, estava “muito gelado”; a brasileira agradece!). Aos que tem pavor de foie gras por questões ambientais ou políticas, peço desculpas (peço nada), mas não resisto nunca a um bom foie gras! Este prato faz parte da cultura e patrimônio franceses da mesma forma que fazem parte o Louvre, Victor Hugo e Napoleão. E podem fazer o barulho que quiserem, não serão abolidos nunca.
O primeiro “prato principal” que veio foi um filé de pescada branca, coberto por um leve molho de alho poró, amparada por uma massa folhada crocante e camarões salteados. No prato ainda tinha duas quenelles de purê de cenoura. Tudo com uma delicadeza ímpar. Era um daqueles pratos que você fecha os olhos durante a primeira garfada. E durante a segunda, a terceira, a quarta… Ah sim, um delicioso Chardonnay para acompanhar!
Em seguinda, um filet mignon de cordeiro com molho de hortelã, legumes grelhados, saladinha de rúcula com presunto cru e uma massinha folhada no meio. Confesso que achei a massa folhada um elemento redundante, considerando que no prato anterior também teve. De qualquer forma, a carne estava rosadíssima e o prato muito bem executado para acompanhar a nossa taça de Bordeaux.
O serviço do local é daqueles super bem treinados para serem discretos, que você nem percebeu que o seu garçom esteve lá, que você não sabe onde é que ele se esconde mas assim que você pensa em pedir alguma coisa, ele brota do teu lado. Prefiro isso mil vezes aos sombras bajuladores.
Nessa parte do jantar eu já estava bastante satisfeita quando, acho que por não ter entendido direito o que disse, me pediram mais uma taça de Bordeaux e um prato de queijos. Dos queijos, todos lindamente bizarros e fedidos, do jeito que eu amo, só consegui dar uma garfadinha pois eu ainda precisava, e sim, precisava, comer a sobremesa.
A sobremesa veio perfeita: uma mini versão de tudo que tinha no cardápio! Um brownie bem fofinho com sorvete de creme de amêndoas, uma tartelette de maçã, uma quenelle de sorbet de maracujá, uma trufa de chocolate frita e uma tacinha de mandarines com creme de pistache e Chantilly.
Infelizmente o meu torpor momentâneo me fez esquecer de tirar uma foto da fachada do local, mas foi só para contribuir com essa atmosfera misteriosa do Auberge de Trois J. O endereço e telefone eu faço questão de deixar para vocês… mas se quiserem ver mais, vão precisar ir até lá!
E eu já estou aqui sonhando com o dia que eu vou voltar lá!
Auberge de Trois J
1 Place du Dr. Paul Gireaux, 61340 Nocé
Tel: +33 02 3373 4103