Glúten e Laticínios: os vilões da era moderna
Há uns 10 anos pouco se ouvia falar em glúten, doença celíaca, intolerância a lactose, alergia à proteína do leite de vaca… Mas pensa hoje. Você com certeza conhece alguém ou alguém que conhece alguém que tem problemas com pelo menos algum desses elementos.
Vamos entender melhor sobre essas doenças.
Glúten: cadê o meu pãozinho?
O glúten é uma proteína presente no trigo, centeio e cevada (a aveia não possui glúten naturalmente mas é processada no mesmo ambiente que os outros cereais. Aqui no Brasil desconheço uma marca que seja glúten-free).
É o glúten que faz a massa do pão ficar elástica e crescer, é ele que deixa os bolos fofinhos (leia mais curiosidades sobre o glúten aqui). Mas ele pode ser seu pior inimigo.
As doenças relacionadas ao glúten são um espectro, numa ponta há a intolerância ao glúten e na outra, a doença celíaca (forma grave da doença).
A doença celíaca é uma doença auto-imune, onde seu organismo produz anticorpos que começam a atacar a parede do intestino. Ela ocorre em aproximadamente 1% da população. Existe um componente genético, mas os sintomas podem demorar muito para aparecer. Na criança geralmente ocorre diarréia crônica, baixo ganho de peso e déficit do crescimento- e geralmente o diagnóstico é mais fácil. No adulto, os sintomas são mais inespecíficos, como dor de cabeça, cansaço, diarréia ou constipação crônica, depressão, dores articulares… Por isso a doença no adulto passa despercebida em mais de 80% dos casos.
Nas últimas décadas houve um aumento considerável na prevalência da doença celíaca. Com certeza os avanços nos exames e o conhecimento sobre a doença contribuem para um maior diagnóstico. Mas alguns estudos consideram que por alguma razão (talvez o modo como o trigo esteja sendo processado) a incidência está mesmo aumentando, e o “boom” de celíacos não se deve apenas a um maior número de casos comprovados. A doença celíaca é uma doença grave, que leva a um distúrbio na absorção de vários nutrientes e tem conseqüências como déficit de crescimento nas crianças, osteoporose e maior risco de câncer gastro-intestinal. O diagnóstico é feito através de dosagem de anticorpos, testes genéticos e biópsia intestinal. O único tratamento eficaz é a retirada total do glúten da dieta.
foto: Boa Forma
Existem pessoas que possuem os sintomas da doença celíaca, melhoram quando retiram o glúten, mas seus testes são todos negativos. E agora? Provavelmente trata-se de uma intolerância ao glúten. A intolerância ao glúten é uma doença mais recente que envolve outra via da imunidade. Acredita-se que pelo menos 6% da população seja intolerante ao glúten. Ainda não existem muitos estudos sobre as conseqüências a longo prazo desse outro tipo de inflamação, mas é certo que os sintomas desaparecem ao eliminar o glúten da dieta.
É importante aprender a ler os rótulos dos alimentos, pois mesmo aqueles que não são à base de trigo/cevada/centeio podem conter pequena quantidade de farinha ou serem processados em ambientes que sofram contaminação pelo glúten.
Há alguma contra-indicação em se consumir produtos sem glúten mesmo em quem não tem doença? Desde que haja uma dieta balanceada, com outras fontes de proteína e fibras, não.
Num próximo post falarei sobre as alternativas seguras à farinha de trigo.
Laticínios: não confunda alho com bugalhos!
É nessa área que ocorre a maior confusão. As duas doenças mais importantes relacionadas ao leite e seus derivados são a intolerância à lactose e a alergia à proteína do leite de vaca (caseína). São doenças completamente diferentes, com manifestações, níveis de tolerância ao consumo de lácteos e consequências totalmente distintas.
A lactose é o açúcar presente no leite e seus derivados. A intolerância a lactose ocorre quando uma enzima, lactase, não consegue quebrar esse açúcar e este acaba por chegar intacto ao intestino onde bactérias começam a fermentá-lo. Isso leva a um quadro de dor e distensão abdominal e diarreia. Existem quatro formas de intolerância a lactose:
- temporária: por exemplo após diarreias agudas, pelo dano à parede intestinal onde a lactase está presente. Nesses casos a suspensão dos derivados do leite durante o período de recuperação do intestino leva à cura da doença.
- genética: nesses casos há ausência total dessa enzima e o diagnostico é feito logo após o nascimento.
- secundária: ocorre nas doenças crônicas intestinais, como a doença celíaca (por isso é tão comum ver as duas doenças associadas)
- primária: forma mais comum, relacionada ao envelhecimento. O que ocorre é que não precisamos mais ingerir leite após a infância, e a maioria das pessoas perde a habilidade de digerir a lactose naturalmente. A prevalência desse tipo de intolerância varia muito entre a população- é estimado afetar 25% da população branca e até 75% da população negra, asiáticos e indígenas- mas nem todas essas pessoas que perderam a habilidade de digerir a lactose terão sintomas importantes.
Pessoas com intolerância a lactose conseguem consumir pequenas quantidades de laticínios pobre nesse açúcar como manteiga clarificada e queijos fermentados. Há até quem consiga ingerir leite- os sintomas são muito dependentes da quantidade, diferente da alergia.
Além do mais é possível quebrar a molécula desse açúcar na industrialização e assim obtemos os produtos que são à base de leite, mas têm zero ou baixa lactose. Também é possível consumir a lactase na forma de medicamentos antes de se ingerir um alimento rico nesse açúcar.
O diagnóstico geralmente é feito medido a capacidade da pessoa em absorver lactose.
Já a alergia à proteína do leite de vaca (caseína) é uma doença grave que pode ser fatal. Seus sintomas vão desde de alergia de pele à problemas respiratório e até anafilaxia. Nesses casos fica proibido todo e qualquer derivado de leite (nem traços!). Estima-se que 2% da população seja afetada. O diagnóstico é feito através da dosagem de anticorpos.
Há alguma contra-indicação em se retirar os laticínios mesmo em quem não tem doença? Nesses casos é importante se certificar que as necessidades de cálcio esteja sendo suprida por outras fontes alimentares.
Pela gravidade da doença, todas as minhas receitas postadas aqui serão SEM DERIVADOS DE LEITE, pois isso atende tanto aos casos de alergia à caseína quanto a intolerância à lactose.