A coragem de não agradar: quem é você quando ninguém está olhando?
Já parou para pensar o que você faz quando está no seu quarto, só, com apenas a sua própria companhia? Por mais que esse momento ainda possa carregar muitos julgamentos dentro da sua mente, uma coisa é certa: ninguém está te olhando e talvez você faça coisas menos prováveis do que em um grupo de pessoas. É – mais ou menos – isso que traz o livro “A coragem de não agradar”, com mais de 3 milhões de exemplares vendidos desde o lançamento.
O livro discute e traz a luz a discussão sobre o quanto estamos tentando agradar os outros com as nossas atitudes. Assim, ao longo da obra são apresentadas incertezas, medos, possibilidades e impossibilidades sobre a nossa essência e o medo que temos de receber críticas, enfrentá-las e lidar com afirmações sobre nós mesmos. E o mais legal disso é que o livro apresenta tudo isso através de um diálogo, ou seja, não é algo muito dado: são mil interpretações possíveis, questionamentos e novas versões desse mesmo pensamento. Segue o texto para entender melhor:
O LIVRO
“A coragem de não agradar” foi escrito por Ichiro Kishimi e Fumitake Koga, publicado em 2013 e traz em suas 206 páginas uma proposta inusitada para alguns, mas que é bem antiga: o livro é escrito através de um diálogo socrático, assim como fazia Platão, construindo a ideia e o conhecimento, através do debate. A conversa é entre um filósofo (Ichiro) e um estudante (Fumitake), o primeiro oferece ferramentas para que o segundo possa repensar as limitações da sua própria vida – bastante ligadas à preocupação em agradar a todos, às opiniões alheias e o medo de se sentir marginalizado.
As ideias apresentadas pelo filósofo do diálogo são baseadas em Alfred Adler, um dos precursores da psicologia. Um que muito ouvimos falar é Freud, mas Adler, apesar de ser da mesma época e ter relações com ele, apresenta ideias um pouco diferentes, sobre a psicologia individual. Freud dizia que nosso passado e as primeiras experiências da vida estariam no nosso inconsciente, sendo determinantes para nossas ações hoje. Adler, pelo contrário, falava sobre a capacidade que temos de mudar e dar sentido a nossa vida agora, no presente. Importante dizer que estes são resumos bastante simplistas sobre o que é ou foram Freud e Adler, ok?
NEM TUDO ESTÁ NO OUTRO (NEM EM VOCÊ)
O debate se inicia através da reflexão sobre o que os outros podem nos dizer sobre nós. Ou seja, o estudante está o tempo inteiro tentando entender e aceitar o que as pessoas acham dele e o que as críticas implicam na sua existência. E a discussão é: nem tudo está no outro, ele não sabe tudo sobre nós e está tudo bem não agradar todo mundo. É quase um “o que o outro fala não tem tanta importância sobre o que você realmente é”.
E claro, é um ponto aplicado para muitas situações da vida, mas merece avaliação. Ou seja, o que o outro diz, claro, fala muito – e principalmente – sobre ele. Mas o que fizemos diante disso diz muito sobre nós, e esse é o ponto. Algumas palavras chaves para entender melhor: reconhecimento, expectativa e frustrações. Isto é, não precisamos esperar que o outro nos aprove e nem que ele nos agradeça por tudo. Ao mesmo tempo que criamos expectativas sobre as nossas relações o outro também fará isso, mas, olhar para nós é o caminho mais certeiro.
- Mesmo que a discussão seja sobre “nós”, percebe a quantidade de vezes que a palavra “outro” apareceu nesse último parágrafo? O livro é sobre isso: essa dualidade entre dar atenção ao que escolhermos e sobre as relações.
COMPLEXO DE INFERIORIDADE
Uma outra discussão extremamente necessária que o livro traz é sobre o quando nos colocamos para baixo na sociedade, sobre o complexo de inferioridade. Este termo é usado para explicar o sentimento de não estar no mesmo nível que as pessoas a nossa volta e sobre as incertezas, inseguranças e frustrações causadas por isso.
O ponto é que se comparar com os outros é uma ação que merece ser vista com muito cuidado. Afinal, quase sempre irá trazer imagens distorcidas da realidade e fará com que essa sensação de “não estar à altura” venha à tona. Também, é importante refletir sobre essa lógica de “o mundo ser uma competição”, sabe? O fato é que não existem pessoas melhores ou piores que as outras, tudo isso é uma construção social que merece e pode ser questionada.
EXPECTATIVAS
A partir disso também entram na jogada o questionamento sobre as expectativas. Com algumas perguntas para exemplificar aqui: o que os outros esperam de nós? O que você espera de você? Por que temos tanto medo de receber críticas? É quase como se criássemos uma idealização do que podemos ou queremos ser ou o que achamos que as pessoas querem que sejamos. Esse pensamento seria o desencadeante para as frustrações causadas pela quebra disso tudo.
Ou seja, pensar no agora limita (positivamente) a criação de mundos e ideais que não sabemos se vamos conseguir ou que passam apenas pela imaginação. E veja bem, a ideia não é esquecer que temos planos (que planejamos, sonhamos e queremos realizar vontades futuras) ou esquecer que fizemos acordos sociais com as pessoas (a atendente do supermercado espera que você a trate com educação, por exemplo, esse é um “acordo social”). No entanto, questionar essas lógicas e entender que nem sempre atingimos as expectativas dá lugar para arriscarmos mais e sermos quem somos.
BACK TO THE FUTURE
Assim como no filme “De volta para o futuro”, onde eles vão para o futuro e para o passado, mas percebem que as respostas estão sempre no presente. O livro “A coragem de não agradar” traz uma metáfora, para imaginarmos que estamos em cima de um palco com uma luz sobre nós. Nessa situação não consegueríamos olhar para a plateia e seríamos “obrigados” a olhar para nós mesmos e para o que está mais próximo de nós.
E claro, esta é “apenas” uma visão. Outros pensadores dizem outras colocações. Mas, o livro também usa desse artifício de “não agradar todo mundo” e expõe sua ideia, na expectativa de quem nem tudo que está sendo dito poderá ser aprovado por todos, que receberá contraversões e assim o diálogo irá se fazer presente.
MAS, CALMA AÍ!
Se dermos um Google sobre “A coragem de não agradar” ou até mesmo lermos como se fosse um manual para a vida, veremos que: “não é para dar atenção aos outros”, “é para focar mais no presente”, “é para acreditar mais em você” e “não no que os outros pensam sobre você”. Mas, equilíbrio é tudo, né? E essas ideias precisam ser questionadas, ok?
Vamos lá: olhar para o que dizem sobre nós e escutar as pessoas também é um dos caminhos de autoconhecimento e crescimento, o que vale é saber como lidar melhor com isso e seguir em frente mesmo com pensamentos que divergem dos nossos. E por fim, as coisas não são tão simples e como uma receita sobre “o que fazer” e “o que pode dar certo ou errado”. Pelo contrário, saber refletir a partir de ideias é – talvez – um dos princípios sobre a nossa convivência em sociedade e, de fato, o objetivo de “A coragem de não agradar”.
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E você, o que achou do livro ou dessa reflexão? Deixe seu comentário – divergente, se quiser – para discutirmos sobre o assunto.