A tal da gastronomia molecular – parte II
Parte II – A Gastronomia Molecular e a Cozinha Nota a Nota
Partindo da ideia de que você acompanhou nossa conversa no último post, podemos continuar nossa linha de pensamento sem a necessidade de muitas introduções! Se você não leu acesse o texto aqui.
Então, concluímos em nossa última conversa, que a Cozinha Tecnoemocional não se define dentro da Gastronomia Molecular, visto que os cozinheiros, chefs, confeiteiros e afins se utilizam de máquinas e tecnologias e até recorrem a cientistas e estudiosos afim de buscarem meios para tornarem suas ideias, sensibilidades e emoções em pratos surpreendentes.
Logo, a verdade é que Gastronomia Molecular foi só o ponto de partida para uma verdadeira revolução na cozinha. No seu modo de cozinhar – claro, e o que eu mais gosto: no seu modo de pensar. Pensar? E cozinheiro pensa?
É meus caros… Pensa, e como pensa!
Talvez devêssemos começar lá pelos anos 80, quando um químico [Hervè This] e um físico [Nicholas Kurti] se juntaram para criar uma teste de pós doutorado, a qual eles tinham um desejo de poder explicar fenômenos físico-químicos através das simplicidades [tem certeza?] da cozinha.
Com o fenômeno Adriá, muitos cozinheiros passaram a se interessar pela parte química dentro da cozinha a fim de descobrirem métodos novos para turbinarem sua criatividade [a tal da cozinha tecnoemocional que já conversamos]. Nisso, uma nova cozinha surgia. Nada de química, nada de molecular tampouco industrializada – era, ou melhor, é, apenas uma cozinha pensada, analisada, sem nunca deixar de ser instintiva.
Após tantos anos com uma Gastronomia parada, com chefs tentando inovar e criar, com pouco sucesso, eis que surge o ovo a baixa temperatura – ou o tal do ovo perfeito. Ovo esse que uniu a ciência com os chefs ávidos por conhecimento! Afinal, saber cozinhar um ovo na temperatura perfeita a ponto de deixá-lo cremoso fora por anos um dos maiores desafios da cozinha.
Fruto da Gastronomia Molecular, o ovo, esse alimento tão cheio de filosofia [afinal, quem veio primeiro? O Ovo cozido ou a Cozinha?] foi o centro de toda a então, também, filosofia [porque não?] do Senhor Hervé This, que em termos, utilizou o estudo da cocção do ovo perfeito como seu meio para dissipar a Gastronomia Molecular pelo mundo.
Hervé This é um químico, que trabalha em Paris, no AgroParisTech, e é PhD em Gastronomia Molecular – termo esse que cunhou com Nicholas Kurti, físico hungáro, falecido em 1998. Através do site do INRA você pode ler um pouco dos artigos do Sr. This e compreender o que o rapaz [permita-me dizer] veio ao mundo dizer!
O Sr. This adentrou no mundo da culinária, ou melhor, da GASTRONOMIA, desejando profundamente levar às pessoas, explicações químicas sobre… bem, desculpem a repetição – QUÍMICA, através da cozinha. E o cara tem emoção e muita paixão quando fala sobre o assunto.
Explicações básicas sobre batatas fritas são feitas através da Gastronomia Molecular, ou então porque um bolo não cresce ou porque ele sola. Porque a carne fica mais gostosa quando grelhada e não quando cozida ou então até porque choramos quando cortamos cebola!
Explicações que a química de alimentos nos dá facilmente, porém as vezes em palavras de difícil compreensão, a Gastronomia Molecular torna mais obvias por assim dizer.
Em seu livro, “Molecular Gastronomy, exploring the Science of flavor”, Hervé This explica toda a sua boa intenção com a Gastronomia Molecular, dissecando a gastronomia de Brillat Savarin e mesclando com a história da ciência, Lavoisier e seus estudos sobre caldos [ou fundos, como chamamos em cozinha] e Parmentier e o estudo das farinhas utilizadas para produção de pão por exemplo, até então conseguir concluir:
“Química e física, quando bem aplicadas, podem nos ensinar a como preservar a suculência das carnes. Como dominar as reações químicas e dar aquela casca dourada com aroma irresistível. Podemos evitar erros comuns ao tentar fazer molhos como maionese ou molho holandaise, bernaise, e tantos outros. A Ciência não só nos guia como também nos ajuda a exercitar nossas capacidades de descobertas e invenções.
Você acha suficiente ler livro de cozinha? Receitas? Claro que não! Eles são apenas coleções de receitas que reduzem cozinheiros a meros executores. Além do mais possuem uma série de passos confusos.
A Gastronomia Molecular busca dar conhecimento prático através de explicações de como algumas receitas funcionam e quais erros podem ocorrer e o porquê!”
Uma das melhoes explicações visuais que vi o Sr. Hervè This fazer foi a mousse de chocolate com água. Caramba, é algo tão óbvio mas que eu passei a vida tentando evitar, simplesmente porque me diziam N vezes até aquilo grudar no meu cérebro e me impedir de ver além.
A ÁGUA ESTRAGA O CHOCOLATE.
Ora… por que cargas d’água quando eu perguntava “por que?” a única resposta que eu tinha era “você não vai conseguir mais usar o chocolate”?
Ok, o chocolate realmente acaba que “estragando” para alguns usos comuns. Mas jogar fora?
Foi através da Ciência que o Sr. Hervé This explicou: mousse. Mousse? Isso! Mousse!
(Clique aqui para aprender a fazer a mousse de chocolate com água.)
Chocolate é uma gordura. Gordura e água não se misturam, mas se emulsionam! Assim como a maionese – ovo e óleo. Logo, se eu bater essa mistura a ponto de diminuir tanto as moléculas até elas formarem a olho nu um sistema único, eu vou ter uma emulsão.
E ponto.
Aluna agora pergunta: Por que água e chocolate não combinam?
Professor responde: Ora, querida. O água em contato com o chocolate impedirá que ele possa ficar fluido o suficiente para ser derretido ou temperado, evitando assim uma boa cristalização.
Aluna diz: Então se cair água no meu chocolate eu devo jogar fora?
Professor diz: Não! Vou explicar para você o princípio da emulsão e vamos fazer uma experiência a fim de que você compreenda melhor o que acontece com o chocolate.
A Gastronomia deveria ser assim! Professores mais curiosos, que pensem fora da caixinha e levem aos seus alunos explicações mais claras. Dessa maneira poderemos ter mais chefs sensíveis e menos reprodutores! E talvez a Gastronomia Brasileira se desenvolva de uma maneira mais interessante!
Mas o que tudo isso tem a ver com a Cozinha Tecnoemocional?
O fato é que o Sr. This, junto com tantos outros cozinheiros, se encheu. Sim meus amigos, ele se encheu da mídia, dos rótulos e das pessoas não entenderem a real razão de ele ter colocado seus pezinhos e seu jaleco branco, no meio de panelas, fogos e cozinheiros mal encarados. Ninguém entendeu… Talvez, nem os cozinheiros tenham entendido. E então, ele simplesmente saiu de cena. Deixou as panelas para quem entende de panelas e se refugiou novamente no seu INRA, com seus alunos, todo o seu conhecimento e sabedoria sobre o assunto a serviço de quem interessar.
E sabe por que ele se encheu? Porque até hoje as pessoas insistem em falar que Ferran Adriá faz – ou fez – Gastronomia Molecular. Quando não é, nunca foi e dificilmente um dia será! Bom, isso já não posso afirmar, esse outro rapazinho está alardeado pelas salas de Harvard agora. Vai que…
Gastronomia Molecular portanto, foi um estudo científico, feito por pessoas que entendem de química, de física, de moléculas, de reações cabulosas e complicadas, para explicar de maneira simplificada – no melhor estilo “Química para quem não entende de Química” – o que é, novamente tenho que pedir perdão pela repetição – QUÍMICA. O que são reações básicas que acontecem nos alimentos. Porque a maçã escurece, porque cozinhar vegetais verdes em água faz com que escureçam. Tantos “por quês” que nos perguntamos quando vivemos dentro de uma cozinha e muitas vezes não sabemos responder, apenas fazer. Ou porque nos falaram o jeito certo ou até então, insistimos no errado, por falta de conhecimento.
Com a Gastronomia Molecular extinta – sinto muito dela não entrar na linha do tempo da gastronomia ao lado da também Cozinha Tecnoemocional, mas… – Hervé This resolveu cunhar outro termo para continuar seus estudos sobre a química na cozinha, que é a Cozinha Nota a Nota, na qual ele explica, esmiuçadinho, tudo que ele explicava pela Gastronomia Molecular, mas agora com um termo que talvez seja de melhor compreensão. Seja para você e para mim, seja para um cozinheiro profissional que tem uma ideia enraizada na cabeça e precisa mais do que uma simples receita para transformar sua criatividade em realidade.
O que os cozinheiros fazem dentro da cozinha é simplesmente, após estudar, por exemplo, por que um ovo consegue ser tão perfeito se cozido a uma temperatura controlada, sem variações, é entrar na cozinha e produzir esse raio de ovo perfeito. Simples assim. Nada de molecular, nenhuma equação, nada, juro! Só sensibilidade, pura e pensada!
Isso mesmo, o nosso amigo cozinheiro não perde sua sensibilidade, ele não se torna um nariz empinado [com algumas exceções] e nem deixa de ser um bom cozinheiro só porque agora ele…. PENSA!